Estamos experimentando uma maneira nova de trabalhar com banda aqui no Brasil. Querendo ou não, banda de rock tem uma exigência de estrutura e equipamento que inviabiliza nossos shows em muitos lugares. Queremos fazer poucos e ótimos shows. Isso acaba educando nosso público a ver a gente, pois não é sempre. O fato só ter lançado poucas datas de primeira fez com que a procura tenha sido enorme. Nós nunca tínhamos feito ingressos esgotados no Opinião.
Até poderia abrir data extra.
Mas neste caso queremos buscar educar nosso público que um show é um momento insubstituível, que é de verdade, um momento que está acontecendo ali. Com a quantidade de oferta de shows, inclusive nossos, isso vai banalizando. Nosso fã já foi a 10 shows, como é que vai fazer ele ir ao décimo primeiro? Então tem que ter esse caráter único. Com menos shows, a gente consegue concentrar nossa energia de maneira tão mais focada, de fazer ser um negócio que vamos dar 200% do que a gente tem, sem pensar que tem fazer mais três shows no final de semana.
Como é estar na mesma banda há 20 anos?
É tanto tempo que minha história pessoal se confunde com a história da banda. De quem está na banda também. O Vavo (Gustavo Mantovani, guitarrista) começou a banda comigo. Acho que existe um esforço nosso de convivência para não chegarmos a ter grandes tretas. Como em um relacionamento, tem que ser mantido na base do respeito e da iração. Depois de ar tudo que a gente ou, de ser uma banda que tocava no primeiro lugar das rádios, MTV, aqueles prêmios e maluquices todas, já conseguimos ter o distanciamento de tempo para perceber que esse sucesso é bastante ageiro. Quando encontro um cara de banda nova que está fazendo sucesso pela primeira vez, sinto vontade de agarrar aquela pessoa e dizer: "Cara, não acredita nisso, faz as tuas músicas, continua focado no que tu amas e curte fazer". Estar em primeiro lugar fazendo shows lotados pode ser ageiro, que não tem como manter. Já amos por tudo isso. Vimos muitos artistas surgirem e se tornarem o maior do Brasil, mas caírem no ostracismo. Fico vendo como essas pessoas lidaram com isso. Como eu lidei com isso quando a Fresno parou de ser uma banda que estava em todo lugar. Ninguém me falou, mas eu gostaria que tivessem falado antes, que o jeito era fazer as melhores músicas que eu conseguisse, e tomara que as pessoas achassem que essas músicas fossem boas.
Também há uma base de fãs que acompanha a banda desde a década de 2000 e cresceu tendo vocês como trilha sonora. Como esses fãs acompanham a Fresno hoje?
Hoje esse pessoal está nos seus 20 ou 30 e poucos anos. Todo momento de crise, como a que o país atravessa agora, exacerba o saudosismo. Isso explica o sucesso de Sandy e Junior agora. O pessoal voltando a assistir e debater Friends. O cara consumia uma coisa quando era adolescente, cresceu, virou adulto, se distanciou por causa da vida. Quando o cara está lá, mais estabelecido, consegue respirar e falar: "Putz, mas isso era legal". Vejo as pessoas voltando a ir ao nosso show, mas agora com o filho e com o marido ou a mulher. O saudosismo acontece quando cada movimento completa seus 10 ou 15 anos, e estou vendo esses revival muito forte de emo. Querendo ou não, Fresno é uma referência dessa galera no Brasil.
É curioso que a banda é associada àquela geração de bandas do hardcore e do emocore dos anos 2000, com Nx Zero e Forfun, porém me parece que vocês transgrediram essa bolha.
Era uma cena com várias bandas de inclinações diferentes. Não era o mesmo tipo de som, havia bandas como a gente, mas também tinha bandas que iam para um lado superpop, como Cine. Ao mesmo tempo, nos consideramos filhos de uma geração que tem M 22, Garage Fuzz e Dead Fish, grupos mais identificados com o punk rock e hardcore. Mas naquela época estavam todas num bolo parecido. Enquanto fenômeno cultural, o emo foi mais relevante porque era tendência de jovens que começaram a quebrar aquela noção de masculinidade do macho alfa. Principalmente pelas nossas letras mostrarem um cara que não está com vergonha de falar de amor ou de temas mais pesados, como depressão, o olhar melancólico sobre a coisa. Quando começamos, isso não era uma tendência lá no começo dos anos 2000, mas era a maneira que eu fazia música. Hoje são pautas tão presentes na sociedade, da quebra da masculinidade tóxica, de mostrar a vulnerabilidade. Esse lado do emo como fenômeno cultural trouxe à tona essa discussão e propôs um novo modelo de homem. Hoje isso é uma pauta que já está batida, mas em 2008, enquanto as pessoas estavam batendo e chamando emo de veado, ninguém estava discutindo isso.
O que você espera para os próximo 20 anos de Fresno?
Além de continuar tocando, que estejamos falando de outros problemas. De problemas novos. Sempre vai haver problemas. A humanidade evolui através da necessidade de resolver nossos problemas, de fazer nossa vida ser melhor e ser rica. Queria estar falando de outras coisas, não do que a gente vive hoje, ou que os nossos pais viveram. Vou querer estar falando sobre coisas diferentes daqui 20 anos. Com as pessoas querendo ouvir isso e vindo tocar no Opinião, ainda velhinho.